segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Quatre-vingts - A arte de fazer 80 anos









O texto abaixo, de autoria de Washington Luiz Bastos Conceição, foi publicado em seu blog "Escritos do Washington" , apenas com o Quatre-vingt no título. Optamos por adicionar o "Arte de fazer 80 anos", pois foi assim que sentimos o texto.   

A quem interessa saber se alguém está completando 80 anos?

Aos seus parentes e amigos, parece-me. Os conhecidos, que em geral se mostram surpresos, com sinceridade ou não, dão pouca atenção ao assunto. Destes, serão exceções, provavelmente, aquelas pessoas que estão se aproximando dessa idade e passam a se preocupar mais com o que lhes reservarão os próximos anos.
Mas o próprio, o aniversariante, fica impressionado, pois sabe que, mesmo com o aumento significativo da expectativa de vida nos últimos anos, já passou da média, já está usando o lucro, a colher de chá do Todo-Poderoso.

Pois bem. O preâmbulo é para lhes contar que este mês estou entrando no time dos oitenta; com sentimento mesclado de admiração, preocupação, curiosidade, e com a sensação de que não está acontecendo comigo. Eu, um octogenário, incorporando a imagem que eu mesmo via dos mais velhos, há tão pouco tempo?

Não resisti, quis comentar o assunto com vocês, os poucos (porém atenciosos) leitores de meus escritos.
Oitenta, assim de repente, parece um número pesado.
Só que essa idade não chegou de repente, a velhice não se instala de vez; vai progredindo lentamente, sub-repticiamente, impondo novas restrições físicas, exigindo manutenção e revisões médicas com mais frequência (às vezes requerendo peças de reforço); e, ainda, solapando a memória. Enfim, é todo um processo que se desenvolve após o ápice da forma física, mais ou menos quando se atinge o que se convencionou chamar meia-idade.

Venho pensando, já faz algum tempo, nas várias fases da vida, pelas quais passamos, desde a infância até a velhice. Agora, entretanto, o novo patamar de idade me impressionou e me fez pensar em outra maneira de ver o número – e lembrei-me dos franceses, que não falam oitenta, mas sim quatro vintes, “quatre-vingts”. Ocorreu-me, então, que ao chegar aos oitenta, podemos considerar, por exemplo, que passamos por quatro fases de vinte anos. Nos primeiros vinte, vivemos o desenvolvimento físico e mental, adquirimos as bases do conhecimento. Nos vinte seguintes, a formação e as atividades profissionais, a constituição da família, a inserção na sociedade, o aprimoramento físico e mental. Dos quarenta aos sessenta, a maturidade, o apogeu profissional, o encaminhamento e a emancipação dos filhos. Dos sessenta aos oitenta, com a meia-idade, a adaptação às novas condições físicas, a passagem profissional do bastão e, com a aposentadoria, a ampliação do tempo de lazer; deste, é parte importante e muito agradável, para quem tem o privilégio de ganhar netos, o acompanhamento ao máximo de sua evolução.

Portanto, estou, na realidade, completando os “quatre-vingts”.
E agora, Washington?

Agora, é tratar da vida que me resta, começando por planejá-la.

Estimulado pelo livro “Tempo Orgânico”, do amigo Álvaro Esteves, estou ensaiando um plano de aperfeiçoamento de vida, a partir da visão de como desejo estar dentro de uns três anos, envolvendo saúde, residência, atividades diárias (incluindo o trabalho de escrever), relações sociais e lazer. A partir dessa visão (ou objetivo) que providências tenho de tomar em todas essas áreas para que eu consiga chegar lá nas condições esperadas.

Na verdade, é uma agenda semelhante às dos projetos com que lidei no trabalho a vida inteira. A diferença é que se trata agora de minha vida, nesta nova fase, e que eu tenho de controlar o projeto e não ficar apenas nas boas intenções de ano novo. Espero atingir as metas do plano.

Washington Luiz Bastos Conceição
(http://washingtonconceicao.blogspot.com.br)

domingo, 16 de setembro de 2012

As crises fabricadas por quem gosta de empurrar com a barriga

Tem gente que não tem jeito. Teima em ser “bombeiro” para apagar "incêndios", que ela mesmo provoca. E aí, tem a gratificação de posar de herói, de “salvador da pátria”, conseguindo “olimpicamente” resolver complexas e urgente situações que haviam sido geradas pelo próprio comportamento de procastinador e mau planejador do tempo. Muitos trabalham no modo "combate a incêndio" convencidos de que a adrenalina tem de estar presente.

O procastinador bombeiro usa muitos subterfúgios. Um dos favoritos é o comando de “seja perfeito”. Como tem de fazer tudo de forma irrempreesível, vai esperando o bloco de tempo suficientemente grande para agir de acordo com a necessária perfeição. Como este bloco nunca aparece, ele acaba empurrando com a barriga e tudo desemboca num monumental problema que toma indevidamente o tempo de muita gente .

E, em meio à crise obtém sempre muita atenção para o que fazem. Ficando no centro do palco, sob as luzes coloridas dos refletores, essas pessoas se sentem importantes . É gente que muitas vezes chega cedo e sai tarde do escritório, ou são donas de casa que se “descabelam” e se estafam por deixar para última hora certas atividades que poderiam ter sido feitas semanas antes. Mas assim ninguém saberia das suas façanhas e dificuldades. Há também o estudante que consegue, no último exame do ano, aquela nota difícil necessária para não repetir o ano ou ficar de recuperação. Vira herói diante dos pais e colegas.

Brook e Mullins dão uma receita interessante de como lidar com estes geradores crônicos de crises:

1. Avalie direito - já que as crises são fabricadas, sua importância e urgência provavelmente são menores do que o gerador de crises nos teria feito acreditar. Não se deixe levar pelas evidências. Todo cuidado é pouco.
2. As emoções do incêndio não são as suas - portanto você não precisa compartilhá-las como o gerador. A crise e o prazer de se envolver nelas pertence a ele.
3. Leve em conta a hipótese da existência de crises fabricadas - se você trabalha ou vive com uma pessoa dessas, faça seus planos assumindo que os incêndios virão e preveja o que você pode fazer para antecipar-se a eles e minimizar seus efeitos .
4. O combate a incêndios fabricados é uma forma dispendiosa (em termos de tempo, recursos e desgastes emocionais) e portanto não recompense este comportamento com qualquer gratificação objetiva ou subjetiva. Mostre os outros aspectos vantajosos de não se viver em crises.

E se o gerador de incêndios for você? Aí a coisa muda de figura. É preciso se conscientizar de alguns pontos importantes :
- Sua reputação por ser organizado e competente lhe trará maior confiabilidade do que insistir em ser herói o tempo todo. As pessoas acabam desconfiando desse comportamento e se cansam de gastar sua adrenalina.
- As crises constantes caem na paisagem. As pessoas aprendem a não dar destaque ou atenção a elas. Se pedir ajuda com menos frequência terá muito mais apoio quando o precisar, numa situação de incêndio verdadeiro.
- As crises fazem mal à saúde- seu físico e seu emocional são abalados por excessiva exposição ao stress e à tensão.
- Procure outro tipo de gratificação pessoal - amplie seus hobbies, seus contatos externos. Concentre-se nos seus objetivos maiores na vida os encare como a maior das gratificações quando alcançada.

domingo, 2 de setembro de 2012

Tempo fatiado: você está contando o seu?


Esta história do fatiamento do processo do mensalão – que se revelou uma estratégia ao mesmo tempo didática para os leigos que acompanham o processo e eficaz para julgamentos que até aqui têm se mostrado consistentes – me trouxe a lembrança do fatiamento do tempo.

Mas, ao contrário do ritmo lento e das fatias enormes de cada análise no Supremo, em nossas vidas, cada vez menos nos damos conta de como fragmentamos o dia em mínimos pedaços. E acabamos perdendo a consciência das duas consequências dessa realidade. Por um lado, não contabilizamos a enorme quantidade dessas pequenas coisas que fazemos e acabamos frustrados, sempre reclamando que não dá tempo para nada. Por outro lado, vamos deixando de ter sensibilidade para separar aquilo que de fato é relevante do que é tempo jogado fora, nesses fragmentos que vão se sucedendo, e ficando para trás, um dia após o outro.

Não tenho a menor dúvida que as oportunidades para termos mais tempo aplicado no que é IMPORTANTE passam exatamente por este “varejão” de segundos e minutos e a nossa maneira de lidar com eles. Por trás de cada fatia, grande ou milimétrica, está sempre envolvida uma decisão nossa ao optarmos por uma atividade ou por outra. 

Grande parte dessas decisões passa despercebida, por exemplo, ao desviarmos nosso olhar para um SMS – ou uma postagem de FB - em meio a uma tarefa que demandaria concentração absoluta para ser concluída com eficácia.  Ou quando estamos multiprocessando informações, em casa, tudo "ao mesmo tempo", com a TV ligada, falando ao telefone, respondendo e-mails no computer ou iPad, ligados nas mensagens no smartphone e passando os olhos numa revista ou jornal. Tudo isso enquanto a panela está no fogo ou outra atividade “analógica” está em curso. 

É claro que o cérebro só dá atenção dedicada a uma coisa de cada vez, mas o fatiamento vai se multiplicando, se acelerando, nos “desgastando” e às vezes nos estressando, sem nos darmos conta disso. E isto impede que possamos fazer um inventário “completo” das mil pequenas ações que fizeram parte do nosso dia, o que nos daria uma sensação gostosa de realização. Possivelmente, uma boa parcela dessas "mil coisas" pudesse simplesmente não ser feita, gerando blocos de tempo maiores para recuperarmos aquelas atividades que requerem de fato maior atenção e reflexão. Aquelas que tanto reclamamos nunca ter tempo para fazê-las.      

Fonte da Foto: http://forum.xda-developers.com/showthread.php?p=25123872